segunda-feira, 27 de janeiro de 2020

olhos.
sinais de fogo
no além-fronteiras
de território
tomado à força.
ouso olhar de volta.

incendeio ou ensandeço?

passo o tempo
para lá da cortina
de fumo.

olhos.
menina dos olhos.
vista grossa
pelo minuto
e uma minuta para
fazer isto de novo.

resolvo não.
o passeio da alegre
arrebata mas
não veste.
muito menos
despe.

olhos molhados.
há prazer
nesse vidro duplo
que culpo
pelo seu primeiro
desleixado
premeditado
olhardevaneio.

cheguei.
pemaneceu-partiu.
pelo meio
ficou
o poema
que por mais não
conseguiu.

um habitué
dos filmes mudos
que realizo
resenho
risco
para estrofes
perdidas de
amores imperfeitos.

olhos.
colho poemas
em forma d'olhares perdidos.

domingo, 26 de janeiro de 2020

eles. os ricos.

fila. bicha.
precipitam-se
os donos do tempo
nos seus carros
a crédito
para as cortarem.

falam. estrebucham.
passam à frente
porque se aprende
com os credores.
não há educação
ou cultura.

fogem. batem.
esperteza,
e antecipação.
ficas na fila
esperando a tua vez
votando no menos
mau
vendo a mata a arder.

fome. bebedeira.
passam carros
sem luz de presença
passo a ser arrogante
porque sou o devedor
que espera
a sua vez.
se reclamo
sou mal-educado
se me calo
aceito o espertismo
espartano.

faustosos. bacocos.
reclamam as oportunidades
os salários
a criminalidade
a emigração
o racismo
e aos poucos
passam à frente
porque os "outros"
também o fazem.
os outros somos
nós. sempre fomos
nós.
não somos ninguém
e os donos dos
diamantes
não se enforcam.
e os donos
do petróleo
têm luz de presença
e avião para as Ilhas Caimão.
eles foram como
nós
mas pisaram-nos
e passaram
todos os riscos.
eles. os ricos.

sábado, 25 de janeiro de 2020

não se faz
deixar água na boca
como se fosse bica
de barragem
ou de Baco
selvagem e os sentidos
tomar.
a tua outra boca
sabe a água
como o mar
que da tua boca
faz saborear.
saudade é não
saber sabor
se tudo o que eu
quero
é saber te beber
de novo.
te fazer querer
jorrar.
é líquido que
a falta de ti,
nos faz menos
corpo.
sólida é a minha
convicção que devemos
mais à água
do que os rios
e à saudade.
mar amar.
mar te querer mar.
mar amar.

#poesia #poesiaportuguesa #arte #amart #art #portuguesepoetry #poetry #palavradejorge

olhos lindos escondidos
atrás do balcão.
descaídos pelas
histórias doutros
pela esperança
de brilharem.
de se encontrarem
afagados
pelo olhar vertical
numa vidraça
que te mostra inteira.
passei de soslaio
e não me viste.
não soubeste
que aos meus olhos
levantados
os teus descaíam
tristes.
eu sei da mulher
que aí está.
eu sei da beleza tua
que se curva
para dentro
abraçando-se
sua.
és tua e no entanto
falta-te o espelho
do que em ti
é mais belo.
tu.

#poesia #poesiaportuguesa #poetry #portuguesepoetry #arte #art #palavradejorge

sexta-feira, 24 de janeiro de 2020

o amor é

o amor é uma lista
que acaba na
primeira linha.
ainda que faça sentido
apanhar aquele
comboio.
linha de Cascais
de volta e de ida.
é uma linha
com uma lista de coisas
por fazer.
como o amor.
o amor é uma lista
de coisas por fazer.
uma das coisas
é renuciar a esse pecúlio.

a minha amiga disse-me
para não repetir
e agora repito
linha com lista
e ida que dista
com a memória dela
na volta.
que detesta
e se revolta
de não perceber.
amor é não compreender.
aceitar e depois
espernear.
escarnecer a sorte.
a puta da sorte
e duma mais alta razão
se erguer.
o amor é voltar
à razão. sereno.
terreno de me deitar tesão.
ela vir-se mais do que
a minha exibição.

o amor é ela já ter
tomado
o teu cheiro
o teu sabor
o teu rubor
o teu silêncio
o teu amor
a tua falta de amor
a tua masculinidade
a tua feminidade
a tua palavra velada
a tua poesia
a tua estrada

o teu fim
o teu nada

e tudo ser finitamente
fácil. confortável.
sofá
cama
leito
desnatado.
práctico. táctil.

sonho com
ela de olhos abertos.
olhos verdes
olhos castanhos
olhos lacrimejando
a falta de futuro.
os olhos que lá longe
nunca voltam a se
encontrar no fim
daquela linha.
e no regresso
olhos escuros
olhando-me sujo
higienicamente
impuro
hermeticamente
injuro voltar a ser
de alguém como
de ninguém.
nunca fui meu.

o amor é
não ser meu

se não
tive o que o
inferno
e o céu quiseram
para mim.
e se não vou
para lado nenhum
porque hei-de amar
assim?
de alguém.
de mim ou deles.

o amor é
carne
e lobo que toma
as peles.
é instinto
do animal que fui
contigo.
das presas cravadas
na tua carótida.
fruí longa e rápida
a noite
que em nós nunca
para o dia fugiu.

o amor é
uma lista infindável
que para nada serve
e tu não vieste às compras.
rouba a primeira
merda que encontres
e toma a fome
como a noite que acaba
lenta e rapidamente.

daqui a pouco já
é dia e o amor
ficou no tédio
das famílias
passeando as metas
adquiridas.
o certo de cada ítem
da lista.
nada mais
ou pouco para assinalar.
já não apanham aquela
linha
porque vão de carro
no sentido contrário.
tudo rotineiro, tudo ordinário.

uma pista:

o amor é a noite
listada de dia
que entra pela janela
riscada de tons
no corpo dela
no meu.
o amor é o corpo
que acaba na morte
e nada mais para
além dele.
para além dela.
o amor era...

terça-feira, 21 de janeiro de 2020

Palavra de Hoje: Misoginia

Por lapso
perdi-me da palavra.
Perdi-me por nunca
me ter sido nada.
Em tempos na porta
de entrada
aquela noite malfadada
traria o exemplo.
E depois a palavra
que lhe assentava
como uma chapada.

cresci do lado da mãe.
da mulher desvirtuada.
da mãe mais que mulher.
da mulher menos que fado.
deu ao mundo vida
e do fado só os dias
onde a voz ficou
guardada
           para o murmúrio.

o fado fazia-se desprezado
não pela voz
mas pela escolha.
pelo doença que toma
a mama
pela mama
que já não se toma.
nem de mãe
muito menos de mulher.
de fado.
de nem às paredes
lhe dar azo
nem uso
nem prazo.
tudo calado.

Misoginia
a palavra que desuso.
um triste fado.

sexta-feira, 17 de janeiro de 2020

Mesmo Chão

resoluções
para colmatar a inutilidade
dos dias.
caminhar para o fim
com a firme convicção
que disto no Ser,
no seu próprio Ego
e finita existência,
de nada serve.
ter consciência
serve para sofrer
antes de lá chegar.
todos os que
se abstaíram sabiam
disso.
e sofremos ainda mais
pelo que de bom
vive na parca existência
e que vai e vem
como astronauta
demasiado absorvido
para nos olhar
de frente.

Ai amor que flutuas
e desvaneces a dor!
Ai o destemor
que é viver rendido
à distracção!

vai e vem
e o fim chega
no corpo e no coração.
e reproduzimo-nos
para multiplicar a probabilidade
de mais de nós
chegarmos à mesma conclusão.
e ao mesmo fim.

mas o amor e
multiplicação da espécie
dividem os males.
podemos morrer
descansados
dos amores imperfeitos
e desculpados
dos amores
multiplicados.
somos os nossos deuses
da finitude
para que o céu
pareça mais estrelado
e alguém ao nosso
lado
menos só.
menos do que nós.
morremos
e voltamos
à terra e ao mesmo
pó.

amarei o chão
que piso
como o amor
espacial.
friso,
morrerei só
e só com
os que amei
na minha última saudade.
esses herdarão
o chão
que é tudo o que tenho
e tudo o que conheço.

sábado, 11 de janeiro de 2020

Sempre achei
que se instalasse
em mim a emoção
feminina,
uma empatia além-gajo,
uma intuição
de calçar o mesmo
salto alto delas
que levaria vantagem
como homem
e sobretudo
como ser humano.
Que seria a evolução
concretizada de ser melhor
por Ser apenas.
Igualdade na diferença
e saber diferenciar
igualdades.
Descobri a roda.
Fiquei a sós com
o mundo e dar-me com
todos,
mesmo os parvalhões
como talvez eu para
eles ou outros,
a desistir destes
numa auto-sobrevivência
dalailâmica
e num perdão ao próximo
como a mim.
Mas fiquei mais a sós
com os que amo,
cada vez mais a sós
e amar a ideia
de nós mesmo
que tenha chegado lá
a esse banquete sozinho.
E vão chegando
e alguns partindo
(não podemos estar
todos ao mesmo tempo
neste cantinho).
Vale neste estacionamento
grátis do peito
o jeito que se tem
para amar deixando
ir e ficar um pouco deles
enquanto viajam
para fora de nós
nos seus afazeres.
Mas o prazer de ser
mais do que só este
género e tipo
é saber receber bem,
doméstico,
sem letreiros luminosos
de convencer a entrar.
Entra quem vem por
bem, por vinho,
porventura amor.
A porta está aberta
mesmo que por vezes
não esteja,
deixo fotografias
no álbum de memórias,
luz nas janelas
das vistas mais lindas
e amor no leito
que de mim ainda se sente
quente.
"Volto já!"
de repente
se vier da minha gente.
Isso prometo. "Hoje sonhei contigo
e deixei-te torradas
na mesa para o pequeno
almoço.
Para que quando acordasses
do meu sonho
soubesses que ainda
cá estás
e que eu volto já."

#poesia #poesiaportuguesa #arte #art #amart #poetry #portuguesepoetry #palavradejorge

quinta-feira, 9 de janeiro de 2020

Espelho a preto e branco

se te escondes
como te revelas
diz-me onde e prometo
não te prometer.
ficar em branco e preto
na cama
ou onde melhor
convier.
seja eu, o teu rebordo,
o outro ou outra mulher.
mas que seja com
cores quentes
em brancos e pretos
entre a escada e a parede.
entre o reflexo
e o espelho.
entre ti, eu
e o meio.
sem freio.
branco e preto
devaneio.

quarta-feira, 8 de janeiro de 2020

percorrer a (m)ilha

quero que saibas que noutra vida seríamos pelo menos tentativa.
mas permite-me um dia destes
sermos pelo menos companhia
junto ao mar
ou a qualquer sítio onde os teus olhos abram janelas dessa bondade.
da beleza da bondade

esse corpo, o meu e uma ilha,
eu ilha
(eu ia)
seriam viagens de ir e voltar.
ser terra e amarar.
amarrar em mim
e libertar-te para que queres ser.
seres prazer, amor, mulher.
voltares a mim como à ilha.
à terra em que o teu mar
me torneia e me toca.
volta,
que os beijos serão molhados

serei só a ilha paradisíaca à qual vais viajar.
que te faça descansar a alma
e te leve e fazer-te
sentir-te mulher.
tens sido tanta coisa
de coisa tanta.
E a mulher,
que se cuida,
que se gosta,
que lhe gostem?
eu gosto.
gosto de ti.

segunda-feira, 6 de janeiro de 2020

"Volto já!"

Sempre achei
que se instalasse
em mim a emoção
feminina,
uma empatia além-gajo,
uma intuição
de calçar o mesmo
salto alto delas
que levaria vantagem
como homem
e sobretudo
como ser humano.
Que seria a evolução
concretizada de ser melhor
por Ser apenas.
Igualdade na diferença
e saber diferenciar
igualdades.
Descobri a roda.
Fiquei a sós com
o mundo e dar-me com
todos,
mesmo os parvalhões
como talvez eu para
eles ou outros,
a desistir destes
numa auto-sobrevivência
dalailâmica
e num perdão ao próximo
como a mim.
Mas fiquei mais a sós
com os que amo,
cada vez mais a sós
e amar a ideia
de nós mesmo
que tenha chegado lá
a esse banquete sozinho.
E vão chegando
e alguns partindo
(não podemos estar
todos ao mesmo tempo
neste cantinho).
Vale neste estacionamento
grátis do peito
o jeito que se tem
para amar deixando
ir e ficar um pouco deles
enquanto viajam
para fora de nós
nos seus afazeres.
Mas o prazer de ser
mais do que só este
género e tipo
é saber receber bem,
doméstico,
sem letreiros luminosos
de convencer a entrar.
Entra quem vem por
bem, por vinho,
porventura amor.
A porta está aberta
mesmo que por vezes
não esteja,
deixo fotografias
no álbum de memórias,
luz nas janelas
das vistas mais lindas
e amor no leito
que de mim ainda se sente
quente.
"Volto já!"
de repente
se vier da minha gente.
Isso prometo.

"Hoje sonhei contigo
e deixei-te torradas
na mesa para o pequeno
almoço.
Para que quando acordasses
do meu sonho
soubesses que ainda
cá estás
e que eu volto já."

quinta-feira, 2 de janeiro de 2020

Gosto de Ti como do Mar à Terra e de Ti a mim

"gosto de ti (...)
gosto (tanto) de ti"
e não me ouviste...
fizeste como se não
me ouvisses.

eu perdi amor
do amor teu
terra-firme.
atirei o meu batel
para me buscar,
meio perdido
meio para lá
do alto-mar.

"serei mar
e tu serás terra-firme."
farol que desenvolve
a rotação da luz
que me diz
enquanto o batel
em mares calmos se afasta

{luz-escuridão-luz}

"amo-te...
a- mo -te...
a - m o - t e ...
a   m     t ...
a       m         e
a      a       e     e"

esvaí-me em mar-alto
no meu mar-próprio.
no meu amor pródigo
e fecundado em marés.

"e és.
és tanto...
és..."

a amada das minhas despedidas.
há nada nas minhas feridas.
nem dor nem amor.
só ausência
de tudo e de ti.
e eu sou esse mar-todo.
de esperança no amor-próprio
e propriamente
no amor-alheio.

sou feio nos olhos
que choram este mar.
sou malévolo
por desamar.
sou marinheiro,
batel,
armada
e o meu próprio-mar.

não sou nada
sem te amar.

mas gosto de ti.
gosta tanto de ti
nos ecos que chegam
de alto-mar.
mas a luz do teu farol
não veio
ouvir nem me chamar,
segue altivo
para o salvamento,
para as boas vindas
de quem quer mesmo
chegar.
de quem vê no meio
da escuridão a luz,
de quem no dia
lhe produz
a sensação
de a ter procurado.
serás terra firme
e eu sempre mar.

indo e vindo
e tu terra para quem
quis ficar.

gosto de ti.
tanto de ti.
de mim mar
a ti terra,
da terra ao mar.
desterrado de amar.
de te amar.

gosto de ti...

gos... to de... ti

go che... go che...

che... che... che...