quinta-feira, 23 de abril de 2020

Tremor

Tenho dormido menos.
Acordo porque quero
e desejo agarrar o dia
pelos cornos
como se ele fosse
um bovino enfurecido
comigo. A culpa de sentir tremores.
A desculpa de não ter culpa.
E depois lá vêm os Sanchos-
-Pança
quais escudeiros do indefensável
a levantarem pó
com pás de moinho
- queria dizer "paz"
como os erros que lhes apanhamos
na dialética de bom escrivão
de sala no hemiciclo da rede
"socialight"-.
fico nervoso, furioso,
aterrado com as musculadas
ofensas e injúrias da prepotência
e arrogância ignorante.
fico diminuído não pela puta
da retórica
mais pelo bullying-Pança
de escudeiros do indefensável.
E o desamor.
Tremores de perda por vir
e empatia pelas perdas
idas.
Como se morrêssemos de amor.
Sinto-me a morrer de amor
ainda antes de morrer de surto
de estupidez
e depois de gripes ou cancro
ou das doenças
que o universo desfez
nesta terra que se desgraça.
que desgraçámos
e onde se vê o poder da troca
num papel.
tudo a morrer de desamor
uns à troca
e outros por nem sequer
a poderem depositar.
confinei-me à religião das palavras.
que não fique uma por dizer
antes de morrer por amor.

terça-feira, 24 de março de 2020

enquanto escrevo 
diários/
relatos 
dos meus
encontros e perdas
neste cenário,
a guerra lá fora pára
por breves minutos
diários.
ao contrário
entras despojando-me
do livre-arbítrio
de escolher
entre mim e
a minha existência.
e a beleza
superficialmente
abre caminho
entre os meus poros
e por caminhos
devassos
e outros mínimos
até ao meu circuito
sanguíneo.
pulsando chegas
rápida e atroz aos meus
sentidos.
és um copo de vinho
que não bebo
e lhe lembro o sabor
frutado.
sozinho aqui
sou imenso com
tudo aí.
entras de mansinho
mas os estragos
não são cenário
de guerra,
só o cenário
da miúda que por
vezes em si
me "interpela".
minha pele na pele
dela,
poros abertos
e a sensação que
sela.

segunda-feira, 23 de março de 2020

olhos.
olho-os.
compasso
que se faz
arrastado
amarrado
ao regaço
do disparo.
mato-me de conexões
intra-nomininais
intra-anónimas
intra-nossa-parodoxais.
rechaço
traço uma meta.
cabelo cometa
que deixa a porta
ligeiramente entreaberta
à nossa intra-descoberta
e a ela
se fazer mais.
bebo um chá de gengibre
para o pleonasmo.
arritmia
já não sentia o sono assim
tão sonho-musculado/mascavado.
baixo-me e oiço tudo
do que os teus olhos dizem.
eu não estou contemplado
sou um cidadão acoplado
à certidão do nosso
desconhecimento.
ardem-me os olhos
do cloro
que decoro nos
versos que deixaste em
meu nome
na minha mão
na minha cabeceira/cabeça
a mais.
se fosse cego não
te tocava.
deixava as luzes
do teu momento
fazerem-se talento.
linguagem gestual
como braços no lago
ressoando ondas
como as sonoras
e as nossas horas
fora de tempo.
toco-te com pestanas
postiças
por me fazerem verdadeiro
em ti.
tocas-me com mãos delicadas
de um presente
a 1000 pés de profundidade.
lá não se ouve nada.
peixe-espada corta-alga
e algo para nós
sorvermos
antes dum beijo alva
na palma da mão
lavada.
sou teu se me quiseres
mariposa nadar.
concha.
beijo.
macho.
salga e mar-mulher
filtrar.
beija-me os olhos
invisualmente belos
ao teu olhar.



Binómio

tenho um coração 
binómio para ti,
quando sais eu fico
quando saio tu sais
quando saio tu ficas
quando ficas eu fico.
amas outro e eu não te amo.
amas outro e eu fico.
amas outro e eu não fico.
amas-me e eu vou.
amas-me e eu fico.
amas-me e eu também.
amas outro e amo-te a ti porém.
em cada batida
o coração binómio roda
em volta do teu coração.
roda aleatório
e cruzamo-nos
mais rodas do que não.
e será sempre assim.
e então?
vai e volta
que volto e vou
e se não estiver
deixa recado
e se estiver
estou para 
quem agora chegou.
chegaste e eu não vou.
vou mais tarde
se o ficar tardou.
tardemos a roda
do relógio
do coração binómio
de quem não ficou.
ficámos nós
logo após termos 
saído um do outro
para dentro de nós
próprios onde o amor
se guardou.

#poesia #poesiaportuguesa #amart #arte #palavradejorge #art #poetry #portuguesepoetry

quinta-feira, 19 de março de 2020

Volte-Face

mudei.
já não sou aquele
palerma do mundo
novo.
agora cheio de receio
sou um bolo de chocolate
e hopocrisia transbordante.
digo aqui
diante de toda esta
gente
que de ti é tão diferente
que afinal sou igual.
o mesmo mas
borrado de medo
de não ter visto
em ti a salvação
deste mundo
meu.
sou um bem
perecível como
chocolate nas bocas
do povo...
nada de novo
e o açúcar era o nosso
êxtase.
o nosso novo-riquismo
como o dos senhores
por cima dos polos,
dos fogos ou
dos sismos.
tocam os sinos
em rebate
bate
tão profundamente
que agora preciso de ti.
a mulher,
o meu feminino espiritual
a minha mãe
a filha.
o abraço que definha
na esperança residual.
sou chocolate negro
perto do deserto
duma fé.
quaresma
e quarentena,
morremos todos com
pena de não termos
nos detido no peito
certo
que para nós se ofereceu
a céu aberto.
dói-me o peito
e sei que não é mais do
teu desamor.
é a dor de acreditar
merecer o fim
desta vida,
desta inquinada pista
perdida.
até à vista
é vasta.
quem não acredita
não lhe basta.
bastardos uns dos
outros e das próprias
escolhas.
sacamos rolhas e bebemos
o fim do sangue
dum ressuscitador.
uma mãe
um filho, uma filha
um pai,
um neto, uma neta
avós
e a voz da frente de combate.
enfermeiro, médico,
luva, máscara, bata
ninguém se abate
mas caem.
e levantam-se da má sorte
ou da gente
da alma fraca
ou distraída
ou da inconsequência
que mata.
o amor é de quem
nunca saiu dessa frente.
e eu fui fraco
e passei para trás
da tua alma que arrebata
a vida na cara da morte.
amo-te e não posso,
não posso mais
escondê-lo,
seja da falta de sorte
da falta de excesso
ou da falta de nós.
espero que o teu
novo mundo volte.
que da tua face
volte
o sorriso que era
também nosso.

sexta-feira, 13 de março de 2020

Quarente Ama

Tirei o som,
desliguei o mundo
lá fora
e guardei-me cá dentro.
Admiro quem sai
quem sai pelos outros.
Heróis de guerra
na terra onde os afectos
ficaram de quarentena.
Não há abraço
não há beijo
não há sexo
não há jeito
de fazer sem deixá-lo
lá fora.
Fechamo-nos
porque nos fomos bloqueando.
Há ódio no laboratório
do medo.
Há desprezo pelo medo.
Há morte.
Há noite solitária.
Há nada lá fora.
Só o medo real
de não voltarmos.
Que seja por voltarmos
diferentes.
Melhores.
Maiores na compaixão
das palavras
e dos gritos ao preto
ao traveca
à puta
ao chinoca
ao rabeta.
Afinal somos todos
os mesmos na
palma da mão
no espirro
na cara com comichão.
Onde poderemos
pôr uma mão de amor
no futuro
se não deixarmos
de nos lembrar
da nossa humana condição?
Hoje durmo no chão
ou na cama.
Faço do mundo
a minha casa pequena
e cheia de amor ao longe.
Sempre fui bom nisso
mas falta-me o vosso
abraço
o beijo
o sexo
a mão que é a minha
também.
Lavo as mãos passando
tempo
sem que ele note que passou
o tormento.
"Já passou?" pergunto indolente.

domingo, 8 de março de 2020

Tigre de Bengala

debitamos lugares comuns.
desencontramo-nos
em tempos póstumos.
trepidamos cosmos
em velocidade warp
e estendemos anos
em luz
pelas sombras do contentamento
torpe.

não somos comuns
nem temos eventualmente
lugares para pintar
o céu da boca
com sabor a chá de gengibre.
sou um tigre
e tu Bengala.
um animal e outro
terra,
e por isso comuns
nos golfos dos incomuns.

cravo um incisivo
no peito da estratoesfera
e uma pata
no chão da terra
que {és tu}.
eu visceral
e tu viciante.
e perante isto
vale titubeante
apenas a seiva natural
do que é felino
no reino da luz ausente
e eu em ti presente,
encandeando {por oposição}
brilho.

cambiemos
e agora sê meu
céu da boca
e tudo o que quiseres
de mim extrair.
ou luz
ou cantão tigre.
escolhe antes
que este mar
nos colha
e o calor
e nos transforme
a palavra em calão
e gostemos
mais do que as maneiras
à mesa.

agora sou tua presa.

crava uma dor-boa-surpresa
do céu
ao eterno
limbo daquela terça
de madrugada quarta
onde eu era
menos metade
de homem
menos de um quarto
animal
menos de uma vida
teu.

domingo, 1 de março de 2020

O que Cesariny me ensinou

o que Cesariny me ensinou

que as palavras
para além de ti
só fazem sentido
se sorrires.
se me olhares
daquela forma
de olhos
se atirarem ao mar
com os marinheiros
na sua volta-não-volta
ao mundo.
que as palavras
mesmo escritas
ao contrário
- de frente para
trás-
não me trazem
o teu corpo
e os olhos
quando me atiraste
ao mar.
mas voltei
dos cabos tormentos
e das ilhas dos amores
e venho mais
velho. venho mais
desarmado
e mesmo de palavras.
porque o mundo
fez-me ver novas
como árvores
em jardins tropicais
que visito
lhes leio latim
e cheiro
o mesmo.
mas o teu cheiro
é mais do que
a salitra
que me arde os
olhos
lá de onde não
vi mais
do que vi nos teus.

#poesia #poesiaportuguesa #amart #art #palavradejorge #poetry #portuguesepoetry

segunda-feira, 27 de janeiro de 2020

olhos.
sinais de fogo
no além-fronteiras
de território
tomado à força.
ouso olhar de volta.

incendeio ou ensandeço?

passo o tempo
para lá da cortina
de fumo.

olhos.
menina dos olhos.
vista grossa
pelo minuto
e uma minuta para
fazer isto de novo.

resolvo não.
o passeio da alegre
arrebata mas
não veste.
muito menos
despe.

olhos molhados.
há prazer
nesse vidro duplo
que culpo
pelo seu primeiro
desleixado
premeditado
olhardevaneio.

cheguei.
pemaneceu-partiu.
pelo meio
ficou
o poema
que por mais não
conseguiu.

um habitué
dos filmes mudos
que realizo
resenho
risco
para estrofes
perdidas de
amores imperfeitos.

olhos.
colho poemas
em forma d'olhares perdidos.

domingo, 26 de janeiro de 2020

eles. os ricos.

fila. bicha.
precipitam-se
os donos do tempo
nos seus carros
a crédito
para as cortarem.

falam. estrebucham.
passam à frente
porque se aprende
com os credores.
não há educação
ou cultura.

fogem. batem.
esperteza,
e antecipação.
ficas na fila
esperando a tua vez
votando no menos
mau
vendo a mata a arder.

fome. bebedeira.
passam carros
sem luz de presença
passo a ser arrogante
porque sou o devedor
que espera
a sua vez.
se reclamo
sou mal-educado
se me calo
aceito o espertismo
espartano.

faustosos. bacocos.
reclamam as oportunidades
os salários
a criminalidade
a emigração
o racismo
e aos poucos
passam à frente
porque os "outros"
também o fazem.
os outros somos
nós. sempre fomos
nós.
não somos ninguém
e os donos dos
diamantes
não se enforcam.
e os donos
do petróleo
têm luz de presença
e avião para as Ilhas Caimão.
eles foram como
nós
mas pisaram-nos
e passaram
todos os riscos.
eles. os ricos.

sábado, 25 de janeiro de 2020

não se faz
deixar água na boca
como se fosse bica
de barragem
ou de Baco
selvagem e os sentidos
tomar.
a tua outra boca
sabe a água
como o mar
que da tua boca
faz saborear.
saudade é não
saber sabor
se tudo o que eu
quero
é saber te beber
de novo.
te fazer querer
jorrar.
é líquido que
a falta de ti,
nos faz menos
corpo.
sólida é a minha
convicção que devemos
mais à água
do que os rios
e à saudade.
mar amar.
mar te querer mar.
mar amar.

#poesia #poesiaportuguesa #arte #amart #art #portuguesepoetry #poetry #palavradejorge

olhos lindos escondidos
atrás do balcão.
descaídos pelas
histórias doutros
pela esperança
de brilharem.
de se encontrarem
afagados
pelo olhar vertical
numa vidraça
que te mostra inteira.
passei de soslaio
e não me viste.
não soubeste
que aos meus olhos
levantados
os teus descaíam
tristes.
eu sei da mulher
que aí está.
eu sei da beleza tua
que se curva
para dentro
abraçando-se
sua.
és tua e no entanto
falta-te o espelho
do que em ti
é mais belo.
tu.

#poesia #poesiaportuguesa #poetry #portuguesepoetry #arte #art #palavradejorge

sexta-feira, 24 de janeiro de 2020

o amor é

o amor é uma lista
que acaba na
primeira linha.
ainda que faça sentido
apanhar aquele
comboio.
linha de Cascais
de volta e de ida.
é uma linha
com uma lista de coisas
por fazer.
como o amor.
o amor é uma lista
de coisas por fazer.
uma das coisas
é renuciar a esse pecúlio.

a minha amiga disse-me
para não repetir
e agora repito
linha com lista
e ida que dista
com a memória dela
na volta.
que detesta
e se revolta
de não perceber.
amor é não compreender.
aceitar e depois
espernear.
escarnecer a sorte.
a puta da sorte
e duma mais alta razão
se erguer.
o amor é voltar
à razão. sereno.
terreno de me deitar tesão.
ela vir-se mais do que
a minha exibição.

o amor é ela já ter
tomado
o teu cheiro
o teu sabor
o teu rubor
o teu silêncio
o teu amor
a tua falta de amor
a tua masculinidade
a tua feminidade
a tua palavra velada
a tua poesia
a tua estrada

o teu fim
o teu nada

e tudo ser finitamente
fácil. confortável.
sofá
cama
leito
desnatado.
práctico. táctil.

sonho com
ela de olhos abertos.
olhos verdes
olhos castanhos
olhos lacrimejando
a falta de futuro.
os olhos que lá longe
nunca voltam a se
encontrar no fim
daquela linha.
e no regresso
olhos escuros
olhando-me sujo
higienicamente
impuro
hermeticamente
injuro voltar a ser
de alguém como
de ninguém.
nunca fui meu.

o amor é
não ser meu

se não
tive o que o
inferno
e o céu quiseram
para mim.
e se não vou
para lado nenhum
porque hei-de amar
assim?
de alguém.
de mim ou deles.

o amor é
carne
e lobo que toma
as peles.
é instinto
do animal que fui
contigo.
das presas cravadas
na tua carótida.
fruí longa e rápida
a noite
que em nós nunca
para o dia fugiu.

o amor é
uma lista infindável
que para nada serve
e tu não vieste às compras.
rouba a primeira
merda que encontres
e toma a fome
como a noite que acaba
lenta e rapidamente.

daqui a pouco já
é dia e o amor
ficou no tédio
das famílias
passeando as metas
adquiridas.
o certo de cada ítem
da lista.
nada mais
ou pouco para assinalar.
já não apanham aquela
linha
porque vão de carro
no sentido contrário.
tudo rotineiro, tudo ordinário.

uma pista:

o amor é a noite
listada de dia
que entra pela janela
riscada de tons
no corpo dela
no meu.
o amor é o corpo
que acaba na morte
e nada mais para
além dele.
para além dela.
o amor era...

terça-feira, 21 de janeiro de 2020

Palavra de Hoje: Misoginia

Por lapso
perdi-me da palavra.
Perdi-me por nunca
me ter sido nada.
Em tempos na porta
de entrada
aquela noite malfadada
traria o exemplo.
E depois a palavra
que lhe assentava
como uma chapada.

cresci do lado da mãe.
da mulher desvirtuada.
da mãe mais que mulher.
da mulher menos que fado.
deu ao mundo vida
e do fado só os dias
onde a voz ficou
guardada
           para o murmúrio.

o fado fazia-se desprezado
não pela voz
mas pela escolha.
pelo doença que toma
a mama
pela mama
que já não se toma.
nem de mãe
muito menos de mulher.
de fado.
de nem às paredes
lhe dar azo
nem uso
nem prazo.
tudo calado.

Misoginia
a palavra que desuso.
um triste fado.

sexta-feira, 17 de janeiro de 2020

Mesmo Chão

resoluções
para colmatar a inutilidade
dos dias.
caminhar para o fim
com a firme convicção
que disto no Ser,
no seu próprio Ego
e finita existência,
de nada serve.
ter consciência
serve para sofrer
antes de lá chegar.
todos os que
se abstaíram sabiam
disso.
e sofremos ainda mais
pelo que de bom
vive na parca existência
e que vai e vem
como astronauta
demasiado absorvido
para nos olhar
de frente.

Ai amor que flutuas
e desvaneces a dor!
Ai o destemor
que é viver rendido
à distracção!

vai e vem
e o fim chega
no corpo e no coração.
e reproduzimo-nos
para multiplicar a probabilidade
de mais de nós
chegarmos à mesma conclusão.
e ao mesmo fim.

mas o amor e
multiplicação da espécie
dividem os males.
podemos morrer
descansados
dos amores imperfeitos
e desculpados
dos amores
multiplicados.
somos os nossos deuses
da finitude
para que o céu
pareça mais estrelado
e alguém ao nosso
lado
menos só.
menos do que nós.
morremos
e voltamos
à terra e ao mesmo
pó.

amarei o chão
que piso
como o amor
espacial.
friso,
morrerei só
e só com
os que amei
na minha última saudade.
esses herdarão
o chão
que é tudo o que tenho
e tudo o que conheço.

sábado, 11 de janeiro de 2020

Sempre achei
que se instalasse
em mim a emoção
feminina,
uma empatia além-gajo,
uma intuição
de calçar o mesmo
salto alto delas
que levaria vantagem
como homem
e sobretudo
como ser humano.
Que seria a evolução
concretizada de ser melhor
por Ser apenas.
Igualdade na diferença
e saber diferenciar
igualdades.
Descobri a roda.
Fiquei a sós com
o mundo e dar-me com
todos,
mesmo os parvalhões
como talvez eu para
eles ou outros,
a desistir destes
numa auto-sobrevivência
dalailâmica
e num perdão ao próximo
como a mim.
Mas fiquei mais a sós
com os que amo,
cada vez mais a sós
e amar a ideia
de nós mesmo
que tenha chegado lá
a esse banquete sozinho.
E vão chegando
e alguns partindo
(não podemos estar
todos ao mesmo tempo
neste cantinho).
Vale neste estacionamento
grátis do peito
o jeito que se tem
para amar deixando
ir e ficar um pouco deles
enquanto viajam
para fora de nós
nos seus afazeres.
Mas o prazer de ser
mais do que só este
género e tipo
é saber receber bem,
doméstico,
sem letreiros luminosos
de convencer a entrar.
Entra quem vem por
bem, por vinho,
porventura amor.
A porta está aberta
mesmo que por vezes
não esteja,
deixo fotografias
no álbum de memórias,
luz nas janelas
das vistas mais lindas
e amor no leito
que de mim ainda se sente
quente.
"Volto já!"
de repente
se vier da minha gente.
Isso prometo. "Hoje sonhei contigo
e deixei-te torradas
na mesa para o pequeno
almoço.
Para que quando acordasses
do meu sonho
soubesses que ainda
cá estás
e que eu volto já."

#poesia #poesiaportuguesa #arte #art #amart #poetry #portuguesepoetry #palavradejorge

quinta-feira, 9 de janeiro de 2020

Espelho a preto e branco

se te escondes
como te revelas
diz-me onde e prometo
não te prometer.
ficar em branco e preto
na cama
ou onde melhor
convier.
seja eu, o teu rebordo,
o outro ou outra mulher.
mas que seja com
cores quentes
em brancos e pretos
entre a escada e a parede.
entre o reflexo
e o espelho.
entre ti, eu
e o meio.
sem freio.
branco e preto
devaneio.

quarta-feira, 8 de janeiro de 2020

percorrer a (m)ilha

quero que saibas que noutra vida seríamos pelo menos tentativa.
mas permite-me um dia destes
sermos pelo menos companhia
junto ao mar
ou a qualquer sítio onde os teus olhos abram janelas dessa bondade.
da beleza da bondade

esse corpo, o meu e uma ilha,
eu ilha
(eu ia)
seriam viagens de ir e voltar.
ser terra e amarar.
amarrar em mim
e libertar-te para que queres ser.
seres prazer, amor, mulher.
voltares a mim como à ilha.
à terra em que o teu mar
me torneia e me toca.
volta,
que os beijos serão molhados

serei só a ilha paradisíaca à qual vais viajar.
que te faça descansar a alma
e te leve e fazer-te
sentir-te mulher.
tens sido tanta coisa
de coisa tanta.
E a mulher,
que se cuida,
que se gosta,
que lhe gostem?
eu gosto.
gosto de ti.

segunda-feira, 6 de janeiro de 2020

"Volto já!"

Sempre achei
que se instalasse
em mim a emoção
feminina,
uma empatia além-gajo,
uma intuição
de calçar o mesmo
salto alto delas
que levaria vantagem
como homem
e sobretudo
como ser humano.
Que seria a evolução
concretizada de ser melhor
por Ser apenas.
Igualdade na diferença
e saber diferenciar
igualdades.
Descobri a roda.
Fiquei a sós com
o mundo e dar-me com
todos,
mesmo os parvalhões
como talvez eu para
eles ou outros,
a desistir destes
numa auto-sobrevivência
dalailâmica
e num perdão ao próximo
como a mim.
Mas fiquei mais a sós
com os que amo,
cada vez mais a sós
e amar a ideia
de nós mesmo
que tenha chegado lá
a esse banquete sozinho.
E vão chegando
e alguns partindo
(não podemos estar
todos ao mesmo tempo
neste cantinho).
Vale neste estacionamento
grátis do peito
o jeito que se tem
para amar deixando
ir e ficar um pouco deles
enquanto viajam
para fora de nós
nos seus afazeres.
Mas o prazer de ser
mais do que só este
género e tipo
é saber receber bem,
doméstico,
sem letreiros luminosos
de convencer a entrar.
Entra quem vem por
bem, por vinho,
porventura amor.
A porta está aberta
mesmo que por vezes
não esteja,
deixo fotografias
no álbum de memórias,
luz nas janelas
das vistas mais lindas
e amor no leito
que de mim ainda se sente
quente.
"Volto já!"
de repente
se vier da minha gente.
Isso prometo.

"Hoje sonhei contigo
e deixei-te torradas
na mesa para o pequeno
almoço.
Para que quando acordasses
do meu sonho
soubesses que ainda
cá estás
e que eu volto já."

quinta-feira, 2 de janeiro de 2020

Gosto de Ti como do Mar à Terra e de Ti a mim

"gosto de ti (...)
gosto (tanto) de ti"
e não me ouviste...
fizeste como se não
me ouvisses.

eu perdi amor
do amor teu
terra-firme.
atirei o meu batel
para me buscar,
meio perdido
meio para lá
do alto-mar.

"serei mar
e tu serás terra-firme."
farol que desenvolve
a rotação da luz
que me diz
enquanto o batel
em mares calmos se afasta

{luz-escuridão-luz}

"amo-te...
a- mo -te...
a - m o - t e ...
a   m     t ...
a       m         e
a      a       e     e"

esvaí-me em mar-alto
no meu mar-próprio.
no meu amor pródigo
e fecundado em marés.

"e és.
és tanto...
és..."

a amada das minhas despedidas.
há nada nas minhas feridas.
nem dor nem amor.
só ausência
de tudo e de ti.
e eu sou esse mar-todo.
de esperança no amor-próprio
e propriamente
no amor-alheio.

sou feio nos olhos
que choram este mar.
sou malévolo
por desamar.
sou marinheiro,
batel,
armada
e o meu próprio-mar.

não sou nada
sem te amar.

mas gosto de ti.
gosta tanto de ti
nos ecos que chegam
de alto-mar.
mas a luz do teu farol
não veio
ouvir nem me chamar,
segue altivo
para o salvamento,
para as boas vindas
de quem quer mesmo
chegar.
de quem vê no meio
da escuridão a luz,
de quem no dia
lhe produz
a sensação
de a ter procurado.
serás terra firme
e eu sempre mar.

indo e vindo
e tu terra para quem
quis ficar.

gosto de ti.
tanto de ti.
de mim mar
a ti terra,
da terra ao mar.
desterrado de amar.
de te amar.

gosto de ti...

gos... to de... ti

go che... go che...

che... che... che...