quinta-feira, 28 de fevereiro de 2019

joga bonito

faço jogos com
a mente,
disfarçadamente
para que a gente
por algum acaso
se encontre.
de surpresa,
de repente e
defronte.
fica patente que
se foi vontade
tinha de começar
por algum lado.
ficou pendente?
não interessa
nem apressa nada.
é porque tinha de ser
e se não
é porque não estava
destinada.
eu que não acredito
em destino
mas na vontade
manifestada.
fica, não fica, foi,
não volta
encontrou-se
encontrei
dei
deu e depois
não deu bola.
não faz mal
se for destino
volta
se for vontade
é aposta.
é uma tosta mista
e um galão.
um galaró
e uma franga ao serão.
ceia com sermão
beijo na boca
e no peito
a tua mão.
a minha mão
e a tua fome.
nunca mais começa
e aqui com tanta fome.
pequeno almoço
na cama e o rapaz
nem dorme.
é capaz de ser da mão
que embala
a fome
e a esperança
que ela retorne.
mesmo que seja
só imaginação
ou vontade
ou fome de latagão.

terça-feira, 26 de fevereiro de 2019

Olhos que Dançam

Luto com um pequeno
poema contra a morte.
Vivo e em cada olhar
ou amor que podia ter
sido
sentir que é
melhor que nada.
Entraste.
Ocupaste a sala
só com a tua beleza.
Dançavas com os olhos
como uma criança
que vê magia nas coisas
simples.
Assim te vi.
O olhar que se perdia
por ali
e eu ali perdido
no teu olhar
e no teu "convite".
Com vida.
Com a magia das coisas
simples.
Eu também miúdo
perdido em brincadeira
de ti.
Sorrisos de crianças
renascidas.
Antes estas vidas.
Estes amores,
do que vistas perdidas.
Ficámos sem despedidas
mas com a dança
de um dia.
Um destes dias.

Inolvidável

e se eu me esquecer
de como eras?
do traço da tua
face?
de como sorrias
ou o calor
do teu abraço?
se não voltares
tenho de tentar que
vivas em mim
como vivias por ti.
Nem sei bem viver
para mim...
Como faço?
Perder-te antes
sequer de termos sido
uma vida.
Temos de fingir
termos tido tudo
e tudo
ser tudo o que tenho
receio de esquecer.
E se eu me esquecer
de como nos conhecemos?
E se eu me esquecer
de ti,
o que será de mim?

domingo, 24 de fevereiro de 2019

E ela não vinha

Já vi a lua no dia.
Já vi o que outra gente
viu e não via.
Já vi gente nua
e delas que não devia.
Devia ver o sol na noite
mas a menina não vinha
nem eu lá ia.
Lia os astros
e castos são os homens
que ratos se escondem
na provedoria
do bem...
ou do parecer bem.
Pinto um sol
à noite
e vou afoito fazer
brilhar a vida.
Dela ou de quem numa
qualquer ermida
viu santificado
o pecado.
Fazemos uma luz
ao fundo do túnel
e assim apenas vejo
o traço de ti nua
como sol que se deixa
esconder
atrás da lua.

sábado, 23 de fevereiro de 2019

Morri. Aconteceu.

Parei no canto de estrada.
ao fundo
lá ao fundo
... nada!
Rigorosamente nada.
Fiz tudo mal aos olhos
desta gente toda.
Nem agora me convenço
que lhes pertenço
mesmo que esses
sejam meus
e mesmo
que meus não sejam.
Fiz tudo mal e matei-me.
Aos olhos deles.
Matei-me.
Para que ficassem felizes
com o pouco
que achassem que eu lhes
fui ou fiz.
Sou o que sou
deste lado
onde nada lhes sou.
Se depois aqui morrer
esse serei
eu só.
Só!
Matei-me
para expiar os meus
pecados
que lhes alimentasse.
Banhei-me no sangue
que tanto viveu
para si e para eles
sem saberem.
Deixei-me afogar
no sangue do meu
sangue.
Morri.
Morreu.
Indivíduo sem destino
aos olhos
destes mortais.
Morri. Aconteceu.

sexta-feira, 22 de fevereiro de 2019

Amores Vagabundos

é possível sermos
poetas como
vagabundos
que procuram no pouco,
no restante
e no esquecimento
dos outros,
o prazer.
eufemismos para
glorificar as misérias
como as pequenas
virtudes da vida.
procuramos sexo
com mais ardor
e honestidade
que o amor deixado
a céu aberto
pelos incautos
e os desapaixonados.
morremos de felicidade
mais vezes
do que morremos
da miséria alheia.
somos poucos
que tocamos muitos.
assuntos que as mulheres
infelizes
dos maridos alheios e alheados
querem ver resolvidos
nos versos
e nos terços
de cama ou de chão.
ter na mão o amor
em forma de carne.
palpável... visível.
e o poeta morre de amores.
morre de tremores
no coração por
viver essas vidas todas
em pedaços
e pedaços de céu...
ou lá o que isso seja.

quinta-feira, 21 de fevereiro de 2019

Mesmo que não estejas aqui

Cada vez que partes
levas algo de mim.
Alguém deixa ficar
algo de novo.
Mas insistes em partir
de mim.
Passei a aceitar
esse destino
que se impele de natureza
de ser assim
ou a natureza
que se rende ao destino
(talvez isso sim...)
E vens tu
na beleza de alguém
ser-me tudo
e eu tudo não posso ter
sob pena de perder
tudo de novo de ti.
Fico com um pouco de toda
a gente
até que me complete de ti.
Aí partirei eu descansado
e completo contigo.
Mesmo que não estejas
aqui.

quarta-feira, 20 de fevereiro de 2019

Lua Sua

Peça a peça nos fomos
desnudando,
muito antes de sequer
de nos vermos vestidos.
Já tínhamos saltado
esses pressupostos
e o olhar cúmplice resolvera
algum impedimento inicial.
Teríamos feito amor
mas o sexo interpôs-se.
Teríamos sido algo juntos
não fôssemos
autónomos desde os
outros.
Passámos também
a ser outros
sem tempo de nós.
Não culpo ninguém
por querer ser livre.
De ser livre no olhar
do outro.
Mas não posso oferecer
a minha visão
se os seus olhos são seus.
Mirei a lua
com os meus
e como ela assusta,
sozinha e nua.

domingo, 17 de fevereiro de 2019

Chovemos Mágoas

Um dia deixarei
de ser poeta de rua.
Que apanha a chuva
com a alegria de um desalojado.
Serei alvejado pela
falta de amor
que mora mesmo
ao lado
e chora pela calada
da madrugada.
E chove.
E serei poeta
de quatro paredes
meias
com as tuas.
Entrarei pelo teu
murmúrio adentro
e salvar-te-ei dos medos.
Verás que eu sou tu
e que inevitavelmente
eu terei sido a chuva
que te molhou os
pés no desconforto
do lar.
E aí verás que a chuva
e eu
e tu
não somos assim
tão importantes
para carpir tristezas.
Somos água
de lavar pecados
e bebemos
para esquecer
o que é a felicidade
dos outros.

quarta-feira, 13 de fevereiro de 2019

Meus Eus

São os teus corpos todos.
A tesão que eles
em todo o dia
e em todas as noites
me emprestam.
É o amor deles todos
que eu represento
somando-os para ser
algo que queiras de mim.
Acendo-me e carnal,
carnudo,
desejo tudo até
me vir num
e depois nos outros
todos.
Mas enfado-me do teatro.
Quero dar-te mais!
Quero saber desse amor,
desse ardor
que te faz querer-me só
para ti.
Mas sabes que não posso.
Tens mais corpos
e eu sou fraco.
Deixo-me seduzir
sem defesa de todos esses
teus argumentos.
Invento palavras sedosas
para não sujar-te a boca.
Mas quero que me tomes
como um animal.
Um visceral ser
que de poesia
se viu contrariamente
nascer.
Sou teu
se me permitires
ser servente de todos
os teus eus.
Que sejam todos os
amores meus
da pluralidade
e diversidade
de todos os meus
eus.

Velho demais para mim

Estou tão perto dessa velhice.
Senti-a pela primeira
vez em criança.
Sentia a velhice com sabedoria
e solidão.
Feliz portanto.
Pelo meio a beleza
do feminino,
do prazer
e de tentar saber
o que é o amor.
Pensava que ser velho
duraria para sempre.
Como a sabedoria.
O amor seria partilhado
e para sempre.
Não sei amar
por mais que tente.
Sei ser velho
mas a sabedoria
é pior do que
a mulher que se deita
ao meu lado.
Dá-me vontade
mas preguiça também.
E o amor
é a mulher que foi
e que não chegou.
E no meio estou eu
quase velho
apesar do miúdo
que sou.
Apesar de não saber
amar
e não saber da mulher.
A sós
mas acompanhado
dessa velhice toda
que teima em chegar
e sempre esteve por
perto.

sábado, 9 de fevereiro de 2019

Pássaros do Norte

os vidros são espelhados.
nús, somos pássaros
cobrindo o céu
e o prazer.
se vieres.
se o mundo todo
não for entrave.
diz-me que vens
mesmo que te pareça
mentira.
mesmo que penses
que me estás a mentir.
desejar não é mentir.

sexta-feira, 8 de fevereiro de 2019

Navegar na Impossibilidade

É terra coberta
de líquida aventura.
É mar dos descontentamentos
terrenos.
Lançamo-nos ao convénio de partir
para depois voltar.
Será?
Será que partir não é descobrir
Ser outro?
Mas volto.
Tenho sempre de voltar
a quem sou.
E tu voltas comigo?
É infinito concorrido.
Fomos destituídos
de sermos vizinhos
e passámos a ser
companheiros de viagem.
Até que o mar-alto nos
separe
ou o mar acabe.
É líquido e que o mundo
desabe.
É o amor todo
que lá cabe
que não acabe.
Que agarre outros
mundos
e a água seja
nossa de sobreviver.
Velhos e hidratados.
Juntos ou em separado.

quinta-feira, 7 de fevereiro de 2019

Boca de Verdade

Foge-me a boca
para a verdade.
A tua verdade.
A tua boca.
O nosso pecado.
Um fado ralado
com o beijo e o
corpo
que não se cantam.
Não se encontram.
Sabotámos a probabilidade
para que o impulso
fosse de loucos.
Somos corpos
como poucos
ficamos roucos
só dos gritos
que por dentro
se armam ao cucos.
Beijos curtos.
Pecados surdos.
Estamos loucos
e sem desabafo.
Agarro-te tantas vezes
para não me conter.
Não me contento
com pouco
se tu me olhaste
com tudo.
Não sou rude,
sou curto e grosso
modo, sedento.
Bebe-me de novo.
Com essa boca
de verdade.
Com essa sede
de verdade.
Bebe-me por dentro.

Lábios de Sal

sou um beijo.
o teu que dependurado
como o sol
de fim de tarde
me arde do dia.
sal de mar
de chochos ardendo
na memória
tanto como nos lábios.
onde estás tu
quando aprendi
finalmente a beijar?

diferentes, afinal.

restaram as fragilidades.
as lágrimas contidas
que se imiscuem
agora nas dificuldades
de ser igual.
tentei.
tentei de forma abismal.
vi todos por igual
mas muitos
seguiram. correm
de um lado para o outro.
não sou do seu
quintal
ou da mesma ponte.
sorrimo-nos e tal
mas é desta falta de matéria
que nos desagregamos.
ficaram os de coração
e o sinal
que nos aponte
a direcção.
fico só, pronto!
mais um ou outro
como eu,
diferentes, afinal.

terça-feira, 5 de fevereiro de 2019

Alcântara Desamado

Fui ao cinema
ver música.
Chorar por dentro
o choro do invento.
Do tratamento dado
que a vida
ao outro
como eu artista.
Triste a alegria
com que nos deixamos
brindar
quando o amor avista.
A vista que perde
na distância
e que se agua
e a distância
a que obrigamos
quem nos ama.
Cai o crédito
e o débito
do meu apelido.
Lido com isso bem.
Mal com o amor
que me é desconfiado.
Mal com o meu
gesto que quer
apenas ser desapegado.
Cai tudo mal
no meu rio
que desagua em mar
alto.
Choro lavado.
Choro saudade.
Alcântara desamado.

segunda-feira, 4 de fevereiro de 2019

Desacontecimento

Corro atrás de mim.
Busco quem busco
e quem no fundo
ali me espera.
Ou não.
Ou segue
ou nem sequer
quer saber de mim.
Resvala tudo para
desacontecimentos.
Uma soma deles.
Uma subtracção
contínua com resultado
negativo.
Sobra uma voz
que em baixo canta
em inglês.
A alma que se apresta
a ser raptada
como a minha verve
para ir atrás do impossível.
Lá estarás
como a voz que desconheço
e o reboliço
que faz a urbe
separar-nos paredes
meias
e em impossibilidades.
Vou perder-me no ruído
desta cidade
e fechar os olhos.
Vou deixar que me apareças
em mais um desacontecimento.
E lá em baixo
a soul embala-me.
Fecho-te os olhos
para não me veres
nos sonhos.

sexta-feira, 1 de fevereiro de 2019

Disfarçar Amor

Vou mascarar-me do que te
faz feliz.
Vou mascarar-me de amor.
Isso!
Sim!
Vou mascarar-me de amor
porque nunca o fui na
plenitude para ninguém
mas saberei
preencher-te dele enquanto
precisares.
Não será a vida toda.
Esse amor não é para nós
e é um país estrangeiro
ao qual não voltarei.
Mas levo-te até não
precisares mais
de mim.
Será até tu seres amor
de ti
e de alguém que viva
já nessa terra.
Sou um viajante.
Nómada
e feliz com a caminhada.
Quando intervalar
trarei as coisas
deste mundo
para que te revejas
no bem que és!
Espelhos com molduras
de cada lugar.
Em todas elas estiveste
lá antes de mim.
Em todas elas
és tu.
E eu cheguei depois.
Se não te encontrar
sabes que fui à tua procura.
Mesmo que não saiba
amar
a terra onde o Amor
pousou.
Mesmo que só
saiba mascarar-me
do amor por ti.
Quando cair a máscara
saberás que a minha
cara sempre foi
a mesma.
A do amor
que só a ti
desvendei.